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30/04/2011

TJSC. Demarcação. Art. 950 do CPC. Interpretação


Antônio Carlos Marcato, a respeito da petição incial da ação demarcatória, destaca: Além dos requisitos previstos no art. 282 do CPC, a petição inicial da ação demarcatória conterá ainda aqueles do art. 950 do mesmo diploma legal e será instruída, necessariamente, com os títulos de propriedade do autor, sob pena de indeferimento (arts. 283 e 284, c.c. art. 295, VI). [...] O autor deverá identificar o imóvel pela situação e denominação, descrevendo os limites por constituir, aviventar ou renovar, nomeando ainda todos os confinantes da linha demarcanda. Duas observações: (a) a descrição dos limites não será necessariamente minuciosa, mormente porque nem sempre o autor terá condições para tanto. Aliás, a função da perícia, indispensável na demarcatória, é justamente a de fixar o traçado da linha divisória dos prédios [...] (Procedimentos especiais. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 193).

Íntegra do acórdão:

Apelação Cível n. 2010.059765-2, de São Bento do Sul.
Relator: Des. Jaime Luiz Vicari.
Data da decisão: 06.04.2011.
EMENTA: AÇÃO DEMARCATÓRIA. PRELIMINARES. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL NA MODALIDADE ADEQUAÇÃO. REQUISITOS DO ARTIGO 950 DO CPC PREENCHIDOS. VIA ADEQUADA. ALEGADO ABANDONO DA CAUSA INEXISTENTE. ALEGAÇÃO DE RES JUDICATA AFASTADA. PROVA PERICIAL IMPRESCINDÍVEL PARA O DESLINDE DA CONTROVÉRSIA. CORRETO O AJUIZAMENTO DA ACTIO FINIUM REGUNDORUM QUANDO OS LIMITES, À MÍNGUA DE OUTROS ELEMENTOS, MOSTRAM-SE INCERTOS. Mostra-se adequado o ajuizamento da ação demarcatória para discutir acerca dos limites de cada imóvel se os registros de propriedade não detalham esses elementos, pairando dúvidas acerca das linhas demarcandas. Não se configura o alegado abandono da causa pelos autores quando atendem às intimações e impulsionam o feito.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.059765-2, da comarca de São Bento do Sul (2ª Vara), em que são apelantes Pascoal Gaudet, Irene Holler Gaudet, Orlando Gaudet, Darci Hinsching, Irineu Gaudet e Roseli Fodi Gaudet e apelados Ewaldo Paust e Erica Paust:
ACORDAM, em Sexta Câmara de Direito Civil, por votação unânime, afastadas as preliminares, conhecer e desprover o agravo retido e a apelação. Custas legais.

RELATÓRIO
Ewaldo Paust e Erica Paust deflagraram ação demarcatória contra Pascoal Gaudet, Irene Holler Gaudet, Orlando Gaudet, Darci Hinsching, Irineu Gaudet e Roseli Fodi Gaudet, alegando, em suma (fls. 2-3), que são proprietários de terreno situado na localidade de Ano Bom, município de São Bento do Sul, com área de 245.000 m².
Aduziram que Pascoal Gaudet não estaria respeitando os limites das divisas entre as propriedades e requereram fosse julgado procedente o pedido para traçar a linha demarcatória.
Pascoal Gaudet e Irene Holler Gaudet, devidamente citados, ofereceram resposta em forma de contestação (fls. 11-12), arguindo, preliminarmente, ausência de interesse na modalidade adequação.
É que, segundo esses réus, os limites dos imóveis seriam certos e conhecidos, descabida pois a demarcatória por tratar-se de assunto a ser solvido nos interditos.
No mérito, reiteraram não haver dúvida acerca dos limites entre as áreas que teriam sido demarcadas há mais de 80 anos e, por fim, requereram o acolhimento da preliminar ou a improcedência do pedido.
Após a impugnação, o Magistrado ordenou a perícia, procedendo, mais tarde (fl. 119), a substituição dos experts para o levantamento da linha demarcada, sendo interposto agravo retido (fls. 121-122). Feito o levantamento (fls. 161-163) e pagos os honorários do expert, o laudo foi juntado aos autos e designada audiência de conciliação (fl. 214), inexitosa.
A sentença (fls. 218-223) afastou a preliminar suscitada e julgou procedente o pedido dos autores para determinar que fosse demarcada definitivamente a área de acordo com o levantamento pericial.
Os vencidos apelaram (fls. 227-232), pugnando pela análise do agravo retido na tese de que haveria ausência de interesse processual em razão de inexistir dúvidas acerca das divisas entre os terrenos e a extinção do feito ante o abandono da causa pela inércia dos autores.
Quanto ao mérito, alegaram que teria ocorrido coisa julgada em face de outra demanda, de natureza indenizatória, na qual foram discutidos os limites dos terrenos.
Requereram o conhecimento e provimento do agravo retido, com o desentranhamento do laudo pericial por não respeitar o disposto no despacho de fl. 119, ou a cassação da sentença, e os autos remetidos à origem para produção de nova prova pericial. Pleitearam o acolhimento das preliminares ventiladas ou que fosse reconhecida a existência de coisa julgada.
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 238-239), sendo requerida a condenação dos apelantes por litigância de má-fé.
Em estranha manifestação, o Magistrado decretou (SIC) (fls. 241-242) a nulidade da sentença que ele próprio havia prolatado (!!!) ao argumento de que o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de São Bento seria incompetente rationae materiae, nos termos da Resolução n. 22/08 – TJ, e os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça.

VOTO
Inicialmente, consigne-se estarem presentes os requisitos de admissibilidade recursal.
Cumpre registrar que o Magistrado prolator do decisum, Dr. Eduardo Camargo, após receber o recurso (fls. 241-242), entendeu de decretar a nulidade da sentença ao argumento de que o Juízo da 2ª Vara Cível seria absolutamente incompetente, diante dos termos da Resolução n. 22/08.
Passa-se ao largo da estranhíssima decisão e assinala-se que a demanda foi ajuizada em 1976, fazem trinta e cinco anos portanto, e não é possível postergar a apreciação desse feito, até porque, se incompetente o Juiz, este o é para todo e qualquer ato, inclusive de anulação.
Posto isso, analisa-se o agravo retido interposto, uma vez que tal restou expressamente ventilado nas razões do apelo, nos termos do § 1º do artigo 523 do Código de Processo Civil.
Contudo, nas razões da apelação foram esgrimidos argumentos diversos daqueles expostos no agravo retido, restringindo-se a análise do recurso no que foi oportunamente consignado na irresignação de fls. 121-122.
O agravo retido visa à reforma da decisão (fl. 119) que determinou o levantamento da linha divisória, por se tratar de ato desnecessário em razão da natureza da ação, pelo que deveria ser extinta a demanda em razão de inexistir dúvida acerca da divisória dos terrenos.
No entanto, a determinação da MMa. Juíza à época, Dr. Maria Terezinha Mendonça de Oliveira, tinha por objetivo apenas a produção de prova pericial para atestar a real metragem dos terrenos, com o intuito de fixar sua demarcação.
Ademais, a matéria discutida no recurso confunde-se com o arguido na apelação, uma vez que no pedido clama-se pela extinção do feito e na irresignação interposta, preliminarmente, argui-se a ausência de interesse processual ante a via inadequada em face de estar delimitada a área da parte autora. Assim, o agravo retido deve ser desprovido porquanto, na verdade, seu tema confunde-se com o mérito.
Os apelantes sustentam igualmente a existência de inadequação processual, a importar na extinção do processo, por não vislumbrar interesse processual tutelável em razão de inexistirem dúvidas acerca das divisas dos terrenos.
Todavia, é necessário que na ação demarcatória sejam fixados os limites que se visam delimitar, até porque a metragem exposta na inicial é considerada como requisito para a propositura da demanda, nos termos do artigo 950 do Código de Processo Civil, in verbis:
Art. 950. Na petição inicial, instruída com os títulos da propriedade, designar-se-á o imóvel pela situação e denominação, descrever-se-ão os limites por constituir, aviventar ou renovar e nomear-se-ão todos os confinantes da linha demarcanda.
Antônio Carlos Marcato, a respeito da petição incial da ação demarcatória, destaca:
Além dos requisitos previstos no art. 282 do CPC, a petição inicial da ação demarcatória conterá ainda aqueles do art. 950 do mesmo diploma legal e será instruída, necessariamente, com os títulos de propriedade do autor, sob pena de indeferimento (arts. 283 e 284, c.c. art. 295, VI).
[...]
O autor deverá identificar o imóvel pela situação e denominação, descrevendo os limites por constituir, aviventar ou renovar, nomeando ainda todos os confinantes da linha demarcanda.
Duas observações: (a) a descrição dos limites não será necessariamente minuciosa, mormente porque nem sempre o autor terá condições para tanto. Aliás, a função da perícia, indispensável na demarcatória, é justamente a de fixar o traçado da linha divisória dos prédios [...] (Procedimentos especiais. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 193).
Nesse sentido, colhe-se orientação jurisprudencial deste egrégio Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL - DEMARCAÇÃO - CONFUSÃO DE LIMITES NOS TÍTULOS DOMINIAIS - SOBREPOSIÇÃO DOS IMÓVEIS - CABIMENTO DA MEDIDA
A confusão de limites dos imóveis, gerada pelos respectivos títulos dominiais, legitima o ajuizamento de ação demarcatória.
É possível, via procedimento demarcatório, averiguar os limites reais dos terrenos descritos em registros imobiliários distintos. A definição da área pertencente a cada um possibilita a definição dos marcos divisórios, cuja verificação é inviável com a simples análise dos títulos de propriedade (Ap. Cív. n. 2003.026852-9, de Barra Velha, rel. Des. Luiz César Medeiros, j. em 26-10-2009).
Desse modo, mostra-se adequada a ação demarcatória para discutir acerca dos limites de cada imóvel se o registro de propriedade de cada parte não é meio hábil para constatar o ponto em que acaba um imóvel e se inicia outro.
Ainda em preliminar, os apelantes pugnaram pelo abandono da causa pelos autores, que se mantiveram inertes após reiteradas intimações para dar andamento ao feito, com a perda da prova pericial reconhecida pelo Magistrado de acordo com despacho de fl. 156, o que foi revogado por outro Juiz ao assumir a Vara.
Entretanto, não restou configurado o abandono da causa pelos autores em razão de atenderem às intimações realizadas para comparecer em Juízo e impulsionar o feito. Ademais, no que se refere à perda da prova pericial, esta mostra-se imprescindível para o deslinde da demanda, e não é possível sua dispensa, mormente porque sem ela não é possível constatar quais os limites de cada área pertencente às partes.
A referida coisa julgada suscitada pelos apelantes, com amparo na sentença proferida em ação de indenizatória, não delimitou a metragem do terreno de cada parte; restringiu-se a imputar obrigação aos ora apelados em ressarcir pela extração de palmitos em terreno de outrem, impossibilitando a extinção sem resolução do mérito sob este fundamento.
Por derradeiro, os apelados pleitearam a condenação dos apelantes nas penas de litigância de má-fé ante o caráter procrastinatório do recurso ora analisado.
Contudo, a interposição de recurso de apelação, por si só, não induz à condenação do recorrente nas penas de litigância de má-fé, mormente por se tratar de um direito resguardado pela Constituição Federal em possibilitar que a parte sucumbente obtenha decisão de instância superior.
Considerando o exposto, afastadas as preliminares, vota-se por conhecer e desprover o agravo retido e a apelação. Custas legais.

DECISÃO
Nos termos do voto do Relator, esta Sexta Câmara de Direito Civil decide, por unanimidade, afastadas as preliminares, conhecer do agravo retido e do recurso de apelação para desprovê-los.
Participaram do julgamento, realizado no dia 31 de março de 2011, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Substitutos Stanley da Silva Braga e Altamiro de Oliveira.

Florianópolis, 6 de abril de 2011.

Jaime Luiz Vicari
PRESIDENTE E RELATOR

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Código de Processo Civil Interpretado - Carlos Henrique Abrão e Cristiano Imhof

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