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03/05/2011

O Direito à Convivência Familiar e o Dever de Visitação

DIREITO À CONVIVÊNCIA E O DEVER DE VISITAÇÃO A convivência efetiva com os pais, mesmo após a separação, é fundamental para que a criança se desenvolva de forma saudável. A proteção ao direito à convivência familiar está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente em seus arts. 4º, capute 19 a 52,[2] com especial proteção na Constituição Federal em seu artigo 227. Desta forma, a legislação prevê que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes, entre outros, o direito à dignidade e à convivência familiar e comunitária.[3]
Waldyr Grisardo Filho[4] afirma que o direito à convivência familiar, há de ser priorizado pela sociedade, poder público, mas, essencialmente, pelos pais, pois suas responsabilidades não se resumem a dar vida a um ser humano. É fundamental que esse ser, tenha uma criação implementada com afeto e aconchego. Assim, apesar da lei referir-se à guarda como um direito dos pais, também é o menor titular de igual direito de ser visitado.
O grande problema da questão do direito à convivência familiar é quando ocorre a separação dos pais, pois é nesse momento que ambos devem deixar de lado suas diferenças e priorizar as necessidades físicas e psíquicas dos filhos. A dissolução do casamento ou união estável atinge toda a família, mas principalmente os filhos, que se sentem ameaçados e inseguros, diante da temerosa decisão de quem ficará como guardião. “Assim, se por um lado, a separação dos pais, muitas vezes resolve o conflito entre eles, para os filhos traz sérias consequências, pois sempre lhes resulta em muitas perdas”. [5]
O direito de visitas, decorrente do direito à convivência familiar, alicerça-se na necessidade de cultivar o afeto na relação paterno-filial, e de manter um convívio familiar real, efetivo e eficaz, mesmo não havendo coabitação, conforme explica Waldyr Grisardo Filho:[6]
“Diante de uma desunião, a finalidade desse instituto é a manutenção de uma natural e adequada comunicação do filho com o pai ou mãe com quem não convive, para fomentar e consolidar os vínculos paterno ou materno-filiais, encurtando, quanto possível, o contato que existiria no seio da família unida. A pendência desses processos devem repercutir minimamente sobre os filhos mediante o regime de visita que pretende, de certa maneira, mitigar a necessidade de convivência dos filhos com seus pais quando estão sob a aguarda de um só destes.”
Normalmente quando ocorre a separação dos pais, existe um acordo sobre o valor da pensão alimentícia e a programação das visitas, do genitor que não detém a guarda. Ou seja, “o pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação”.[7]
Outrossim, quando findo o relacionamento dos pais, não há interferência no exercício do poder familiar, em conformidade com o artigo 1.632[8] do Código Civil. Nesse sentido Maria Berenice Dias[9] destaca:
“O exercício do encargo familiar não é inerente à convivência dos cônjuges companheiros. É plena a desvinculação legal da proteção conferida aos filhos à espécie de relação dos genitores. Todas as prerrogativas decorrentes do poder familiar persistem mesmo quando da separação ou do divórcio dos genitores o que não modifica os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos (CC, 1.579). [...] a guarda absorve apenas alguns aspectos do poder familiar. A falta de convivência sob o mesmo teto não limita nem exclui o poder-dever dos pais, que permanece íntegro, exceto quanto ao direito de terem os filhos em sua companhia.”
A programação de visitas deve ser respeitada, pois a criança já está sofrendo com a separação de seus pais; logo, não é justo fazê-la sofrer ainda mais em virtude da ausência de um deles. Ambos são de fundamental importância para sua formação. Infelizmente, em muitas situações, os pais estão revoltados entre si e acabam litigando sobre a guarda apenas para ferir um ao outro, esquecendo que no meio desta atitude impensada está uma criança.
Eduardo Ponte Brandão[10]menciona que “[...] não é difícil supor que, em meio ao litígio conjugal, a criança é transformada numa marionete, num joguete, num troféu ou, para usar vocabulário psicanalítico, fetiche ou objeto que tampona a falta”.
Por outro lado, sabe-se da dificuldade do casal em adaptar-se à nova situação e dar continuidade à convivência e dividir responsabilidades sem existir a coabitação. Assim, para que possam cumprir suas responsabilidades com sucesso, deverão priorizar o convívio familiar e para isso “é necessário mais que responsabilidade, é preciso ter afetividade, que é o que se espera que exista entre os membros de uma família, pois uma convivência equilibrada na infância tem como efeito maiores probabilidades de atingir a realização pessoal na idade adulta”.[11]
Maria Berenice Dias[12]explica que além do trauma que a separação pode acarretar aos filhos, os pais podem agravar as consequências fazendo com que ocorra o fenômeno, no qual ela denomina, Síndrome da Alienação Parental:
“Muitas vezes, quando da ruptura da vida conjugal, um dos cônjuges não consegue elaborar adequadamente o luto da separação e o sentimento de rejeição, de traição, o que faz surgir um desejo de vingança: desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro. O filho é utilizado como instrumento de agressividade - induzindo a odiar o outro genitor. Trata-se de verdadeira campanha de desmoralização. A criança é induzida a afastar-se de quem ama e de quem também a ama. Isso gera contradição de sentimento e destruição do vínculo entre ambos.”
O egoísmo dos pais durante a fase da separação afeta diretamente os filhos, vez que não conseguem deixar de lado suas mágoas e priorizar o bem-estar psíquico da criança.
As crianças foram reconhecidas como sujeitos de direitos e, a legislação impôs prioridade aos interesses dos filhos em detrimento dos interesses dos pais. Mesmo assim, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers Ramos[13]lembra que os pais passam a reivindicar a criança, como se esta se tratasse de um objeto, não estando motivados, muitas vezes, pela proteção do interesse desta, mas apenas pela fonte de reconhecimento social para a sua realização e satisfação pessoal, afetando o ex-companheiro.
Recentemente o “Caso Isabela” [14]pôs em pauta a discussão sobre a guarda e visitas, nos casos em que, os genitores não convivem sob o mesmo teto. É preciso avaliar cautelosamente cada caso em concreto, sob a ótica da proteção integral da criança e do melhor interesse dos filhos, para que o direito à convivência familiar seja efetivado em proveito do menor e não em seu prejuízo.
Igualmente importante trazer à baila que hoje, com a promulgação da Lei nº 11.698, de 13 de junho de 2008, a qual institui e regula a guarda compartilhada, os pais podem exercer conjuntamente a guarda dos filhos. Conforme Maria Alice Zaratin Lotufo,[15]diante dos problemas que surgem com a separação, como os sentimentos de angústia e sofrimento, que afloram entre os pais, quando ambos amam de igual forma os filhos e não querem causar-lhes mais dor, com o afastamento de um dos pais, a solução quando possível é a escolha da guarda compartilhada.
Abandonar um filho é violar sua dignidade, pois esse necessita do amparo constante de ambos os genitores. Salienta-se que, uma vez fecundado laços afetivos de mútua convivência, rompê-los bruscamente causa danos à personalidade do ser em desenvolvimento, muitas vezes irreparáveis. Portanto, é necessário sempre priorizar os interesses dos filhos, garantindo-lhes um desenvolvimento saudável e digno, mesmo que isso exija alguns sacrifícios, emocionais e materiais, dos progenitores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em vista aos argumentos apresentados, percebe-se que a família sofreu, nas últimas décadas, profundas mudanças, sobretudo após o advento da Constituição Federal, quando o Estado passou a ampliar a tutela das relações familiares.
Os novos princípios trazidos pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente provocaram alterações significativas nas estruturas familiares. A família atual é a que se forma pelo afeto, através do convívio entre seus membros e não mais através do sacramento do casamento com a finalidade puramente patrimonial e procriativa. Não obstante, o instituto adotou como seus princípios basilares a dignidade humana, a liberdade, a igualdade, a afetividade, a proteção integral da criança e do adolescente e a prevalência do interesse do infante.
A realização pessoal no ambiente de convivência com base no afeto tornou-se a função básica da família contemporânea. Suas antigas funções: econômica, política, religiosa e procriativa, desempenham, hoje, papel secundário devido à sua evolução ao longo da História da humanidade e em virtude da mudança de paradigma do Direito de Família.
Dentro dessa evolução, o conceito de Poder Familiar mudou. Atualmente, não é mais reconhecido como poder e autoridade dos pais sobre os filhos e sim um poder-dever. É dever dos pais e do Estado prover a proteção às crianças e adolescentes, bem como buscar a efetivação dos seus direitos fundamentais. Nesse contexto, a psicologia prevê que a paternidade/maternidade é um fator de grande influência na formação da personalidade do homem e sua ausência é extremamente sentida. Desta forma, quando o vínculo entre pais e filhos se quebra por algum motivo, acarretam sequelas na vida afetiva da prole, tendo em vista a necessidade de proteção.
O equilíbrio moral e afetivo dos pais, durante a união, deve continuar mesmo após a separação. Os pais devem priorizar o convívio familiar mesmo que não subsista coabitação, pois o papel deles na formação da personalidade da criança é essencial. Assim, quando os pais possuem iguais condições de participar na criação do filho, a guarda compartilhada na maioria das vezes parece ser a melhor escolha.
Notas:
[1] Texto elaborado como resultado do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito, na área de Direito de Família, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, no Núcleo Universitário de Guaporé, da Universidade de Caxias do Sul, em julho de 2009.
[2] Art. 4º, caput: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
[3] BRASIL, Lei n. 8.069, art. 4º.
[4] GRISARDO, Op cit., p. 46.
[5] LOTUFO, op. cit., p. 93.
[6] GRISARDO, Op cit., p. 106-7.
[7] BRASIL. Código Civil Brasileiro. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, art. 1.589.
[8] Art. 1632: A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos.
[9] DIAS, Op. cit., p. 380-1.
[10] BRANDÃO, Eduardo Ponte. O problema da criança-marionete e as práticas de poder. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre, v. 5, n.17, p. 71-9, abr-mai, 2003.
[11] LOTUFO, Op. cit., p. 93-104.
[12] DIAS, Op. cit., p. 409.
[13] RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. Op cit., p. 110.
[14] A menina Isabella de Oliveira Nardoni, de 5 anos, morreu na noite de sábado, 29/03/2008, ao cair do sexto andar de um prédio na zona norte da capital paulista, que supostamente teria sofrido sufocamento e esganadura pela Madrasta e o Pai posteriormente pensando que a filha estivesse morta, no intuito de ocultar o crime joga a filha da janela da janela do quarto dos irmãos. O pai de Isabela tinha o direito de visitar a filha e a cada quinze dias ia buscá-la para passar os fins de semana na sua casa, com a madrasta e seus dois irmãos. (Notícia divulgada no Jornal O Estado de S. Paulo. No dia 31/03/2008).
[15] LOTUFO, Op. cit., p. 91.
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FONTE: Prática Jurídica – ANO X – Nº 108 – MARÇO/2011


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