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24/08/2011

Juiz revela "indústria de denuncismo" no CNJ

Jansen

Em artigo no "Correio Braziliense", sob o título "A magistratura no banco de réus", o juiz de direito Jansen Fialho de Almeida, do TJDF, trata das representações oferecidas por grupos econômicos contra juízes no Conselho Nacional de Justiça para intimidá-los.
"Virou operação padrão", diz. "Há casos em que a decisão foi proferida há anos, apresentando-se notoriamente em mero intuito vingativo."

Segundo o autor, "o juiz vira réu num processo que pela lei e pela Constituição Federal preside". "Analisar na via administrativa, ainda que indiretamente, o teor do ato julgado afeta a liberdade e independência do juiz."

Fialho de Almeida diz que, "a perdurar esse denuncismo imotivado, sem que haja qualquer reação, a justiça lamentavelmente vai se acovardando, perdendo cada vez mais o respeito e confiança do jurisdicionado".

Contra essa "indústria da reclamação", ele propõe ao magistrado "ajuizar as ações pertinentes contra os ofensores pondo fim ao denuncismo descabido".

FONTE: Blog do Fred (Folha de São Paulo)

Veja abaixo o artigo:

A magistratura no banco dos réus

A magistratura brasileira vem sendo pressionada e desrespeitada pelos grandes grupos econômicos, especialmente a de primeira instância. Esses conglomerados vêm representando contra os juízes, sistematicamente, tanto no tribunal de origem quanto no CNJ ( Conselho Nacional de Justiça). Virou operação padrão. Refletem: vamos afastar o juiz da causa, pois ele julgou contra os nossos interesses. No mínimo vamos prejudicar sua carreira. Intimidá-lo.

Tentam na via administrativa, correcional, obstar decisões judiciais das quais cabe recurso próprio. Se acharem que o juiz é parcial nas decisões, não propõem as medidas judiciais cabíveis, tais como a exceção de impedimento ou de suspeição. Preferem atacar o magistrado administrativamente. Alguns mentem dizendo que o magistrado responde a várias representações. Afirmam que o juiz praticou tal ato quando está provado nos autos que isso não aconteceu. Há casos em que a decisão foi proferida há anos, apresentando-se notoriamente em mero intuito vingativo.

As corregedorias dos tribunais, não raras vezes pressionadas pelo denuncismo, expõem o juiz ao massacre moral perante seus pares, sua família, e a sociedade. Cabe ao magistrado provar que proferiu a decisão dentro da lei, que não possui qualquer vínculo com as partes e advogados e que não se corrompeu. Esquecem a letra da lei. Fingem não conhecer o art. 5º, II, da novel Carta Constitucional o qual garante que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei". Culpam o juiz porque contrariou seus interesses, visando tirá-lo da presidência do processo. Chegam ao absurdo de pedir investigação sem apresentar um fato concreto praticado a evidenciar desvio de conduta.

Vivemos numa época em que se o juiz é moroso não serve ao mister; se é célere, rápido e cumpridor dos prazos, tem vínculo com partes ou advogados. E lembre-se que a celeridade foi alçada a princípio fundamental na Constituição Federal (art. 5º, LXXVIII).

O juiz, como se vê, vira réu num processo que pela lei e pela Constituição Federal preside. Justiça fraca, acuada, pressionada, não é Justiça! Que falta nos faz um Rui Barbosa.

Desse contexto, se instaurar procedimento contra um magistrado sob o argumento de simples apuração se revela de extrema negatividade quando não praticado qualquer ato no processo além de decisões judiciais fundamentadas. Analisar na via administrativa, ainda que indiretamente, o teor do julgado afeta a liberdade e independência do juiz. O livre convencimento motivado e dentro da lei é inerente ao exercício do cargo.

Em artigo que escrevi logo que foi criado o CNJ, A abertura da caixa-preta, enfatizei que a criação do conselho veio a moralizar o Judiciário em razão de desmandos e perseguições, sob o manto de uma falsa legalidade formal, em manifesto desvio de finalidade e moralidade pública. Terminei o texto dizendo: "A primeira instância agradece ao CNJ ". E o egrégio órgão tem atuado de maneira firme e eficaz nesses absurdos administrativos.

Impende registrar que, na Comissão de Juristas nomeada pelo Senado Federal para apresentar o anteprojeto do novo Código de Processo Civil, da qual sou membro, apresentei proposta para que as decisões de primeira instância, que importassem em execução imediata, tais como reintegração de posse, levantamento de dinheiro, só pudessem ser cumpridas quando transitassem em julgado ou então somente depois do relator do eventual recurso mantê-la. Isso porque, no sistema atual, a lei determina a execução imediata quando prevê que de tal decisão só cabe recurso no efeito devolutivo. Minha proposta foi rejeitada ao argumento da respeitabilidade e efetividade das decisões do juiz, aliada à celeridade do processo e às garantias já previstas no CPC quanto à reversibilidade da medida, exemplificando-se a caução. E a Comissão é composta majoritariamente por advogados. Rendi-me aos argumentos.

A perdurar esse denuncismo imotivado, sem que haja qualquer reação, a Justiça lamentavelmente vai se acovardando, perdendo cada vez mais o respeito e confiança do jurisdicionado. Essa é a realidade da magistratura nacional no tema.

Em conclusão, a única maneira que vislumbro de se acabar com essa indústria de reclamações é o magistrado ajuizar as ações pertinentes contra os ofensores, pondo fim ao denuncismo descabido e instauração de procedimentos infundados, prevalecendo o princípio da independência do juiz a revigorar o respeito à Justiça.


* JANSEN FIALHO DE ALMEIDA é Juiz de direito do TJDFT, titular da 2ª Vara Cível do DF e membro da comissão de juristas que elaborou anteprojeto do novo Código de Processo Civil

* Artigo publicado no Jornal Correio Braziliense, edição de 22 de agosto de 2011


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