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07/11/2011

Entrevista com a integrante da lista tríplice na vaga destinada aos TRFs para o STJ - Desembargadora Suzana de Camargo Gomes

Foto: Fato Notório
SUZANA DE CAMARGO GOMES   
Desembargadora Federal do TRF-3
Graduada em Direito (UFPR). Foi advogada (1978-1981), procuradora do Estado do Paraná (1981-1987). Ingressou na magistratura federal em 1987 (2ª Vara Federal em Campo Grande) e foi promovida a desembargadora federal do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (1995), onde já atuou como vice-presidente (2007-2009) e, atualmente, é sua corregedora. Como juíza e desembargadora federal já integrou os TREs de Mato Grosso do Sul e São Paulo. É professora universitária, autora das obras “A Justiça Eleitoral e sua Competência”, “Crimes Eleitorais” e “Juizados Especiais Federais”, todos pela Editora Revista dos Tribunais. Integra a lista tríplice, na vaga destinada aos TRFs, para ocupar a vaga de ministra do Superior Tribunal de Justiça, em decorrência da aposentadoria do ministro Fernando Gonçalves.  


FATO NOTÓRIO: A senhora consegue não se preocupar com a possibilidade de ser indicada a mais nova ministra do STJ? O que significa, pessoalmente, esta indicação?
SUZANA DE CAMARGO GOMES
: Fiquei muito feliz em poder integrar a lista tríplice desta indicação ao STJ. Claro que para mim é uma honra enorme. Só figurar na lista já é muito honroso. Com o apoio que tenho tido de Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná, tenho impressão que conseguiremos. Teremos esta vitória.
FATO NOTÓRIO: Parte de sua história como magistrada aconteceu em Campo Grande, quando a senhora, junto com o juiz Odilon de Oliveira, eram considerados implacáveis com o crime organizado. Fale um pouco desta atuação.
SUZANA DE CAMARGO GOMES
: Toda minha judicatura em primeira instância foi em Mato Grosso do Sul. Na época éramos poucos juízes, o dr. Odilon e eu, e só existiam varas federais em Campo Grande. Nós tínhamos sob nossa jurisdição o estado todo com problemas com o crime organizado, que já naquela época já começava a deixar suas raízes, especialmente proveniente do Paraguai e da Bolívia, com seus tentáculos aqui no país.
Fizemos uma atuação conjunta muito boa. O doutor Odilon é um exemplo de magistrado e, com certeza, ele tem sido um ícone na defesa da região contra o crime organizado.


FATO NOTÓRIO: A senhora era considerada “grande inimiga do crime organizado” e uma juíza “malvada” com os criminosos. A senhora concorda com estas opiniões?
SUZANA DE CAMARGO GOMES
: Eu sempre me preocupei em ser extremamente justa. Lembro de um sermão do Padre Vieira que deve ser uma lição para todos os juízes, ele diz que ‘até ao diabo há que se fazer justiça’.
Mesmo se tratando de um criminoso da maior periculosidade, dos maiores problemas, enfim, há de se dar a exata medida da pena e de acordo com sua culpabilidade. Sempre me preocupei neste sentido, de sopesar o que era certo e o que era errado e mesmo quando deparava com um criminoso de maior grau de periculosidade, eu buscava ser o mais possível justa – não dar uma pena além do devido nem aquém do devido.
Sempre foi uma preocupação muito grande que eu tive. Não sei se consegui, mas me esforcei muito nesse sentido.


FATO NOTÓRIO: Houve um episódio polêmico, recentemente, sobre supostas gravações de áudio e vídeo de apenados no Presídio Federal de Campo Grande. A senhora é a favor de tais gravações? Inclusive quando se trata de conversas entre apenados e advogados?
SUZANA DE CAMARGO GOMES
: Acho que nós devemos posicionar duas situações: o direito de defesa é um direito inalienável, é um direito consagrado na Constituição e todo réu, todo acusado, tem esse direito – uma garantia constitucional à ampla defesa, ao contraditório; agora nós temos que verificar até que ponto o advogado está agindo em defesa do cliente, o que é legítimo e correto, e até que ponto algum profissional está se desvirtuando, enveredando por uma outra seara que pode, daí, representar uma conduta ilícita.
Por exemplo, quando o advogado deixa de ser um defensor e passa a ser um colaborador na prática criminosa. As duas figuras têm que ficar bem separadas. É claro que no momento em que ele desborda, ele perde esta imunidade que detém na posição de advogado. Ele perde a sua legitimidade como profissional e por isso ele precisa responder nos termos da lei.
Agora, sempre que ele estiver atuando como defensor, dentro do seu profissionalismo, isso há que ser resguardado, inclusive em termos de diálogo e interlocução com o acusado e com o réu.


FATO NOTÓRIO: E dá para dissociar estes dois comportamentos do advogado?
SUZANA DE CAMARGO GOMES: Dá, justamente pelo seguinte ponto: quando o advogado começa a colaborar, de alguma maneira concorre, por exemplo, para a ocultação de algum valor, imaginemos um crime de lavagem. Ele sabe que aquele valor é um produto do crime – oculta aquele valor, ou de alguma forma faz com que este valor ingresse no mercado como se fosse um valor lícito, nós já estaremos numa cooperação criminosa.
Por exemplo, quando se tem um tráfico internacional e ele não se limita a defender aquele acusado do tráfico, mas, de alguma forma colabora, é coadjuvante nesta prática, por exemplo, levando ordens e como deve ser desenvolvido o tráfico criminoso... É claro que ele não está atuando como defensor, ele está atuando como integrante daquela organização.
Então, é neste sentido que há de ser feita a separação, e com bastante rigor, porque é indispensável o advogado. E esse advogado precisa atuar com esta legitimidade, mas sem fazer parte daquele núcleo.

FATO NOTÓRIO: Em 2009 a senhora foi a grande líder do movimento que culminou com a anulação da eleição do então presidente do TRF-3 [Paulo Otávio Baptista Pereira] pelo STF, no entanto, a senhora não conseguiu ser eleita na votação seguinte [Roberto Haddad foi o eleito]. Valeu a pena os seus esforços para alterar a primeira eleição?
SUZANA DE CAMARGO GOMES
: Valeu à pena não só em termos de atuação não apenas no meu tribunal, mas também um critério a ser observado por todos os tribunais. O tribunal não pode ter grupos políticos, não é possível que existam grupos e esses grupos trabalhem como se fossem partidos políticos.
A medida que não se respeite, por exemplo, a antiguidade; a medida que se permite que alguém que está numa antiguidade mais longínqua, acesse a cargos diretivos antes da ordem, isso faz com que haja uma espécie de não de privilégios, mas de favorecimentos.
Isso é incompatível com a magistratura e a judicatura. Nós temos que ter uma total imparcialidade. Nós não podemos, por exemplo, para desagradar ou agradar alguém, julgar de uma maneira ou de outra. O mais importante é o imperativo da imparcialidade, daquele julgamento que é fruto da consciência.
Agora, se o julgador precisar agradar para ser eleito, se ele precisa compor, se ele precisa de alguma forma estar atrelado a interesses outros que não o de fazer justiça, isso pode prejudicar a atividade judicante. Eu fui sempre contra este tipo de situação.
É importante que as pessoas cheguem pela antiguidade, porque chegando pela antiguidade não há discussão, não há necessidade de se agradar, nem desagradar. É importante que se tenha uma espécie só de postura e de conduta.
Acho que, neste sentido, foi importante. Há um critério, este critério precisa ser observado entre os três mais antigos. É claro que entre esses três, um pode ser presidente e outro ser o vice, como aconteceu no meu caso. Não fui eleita presidente, mas nem por isso eu me senti diminuída, pelo contrário, pois só o fato de eu ter conseguido essa vitória e ser observada essa escolha entre os três mais antigos, permite que não haja esse tipo de partidarismo dentro do Judiciário.


FATO NOTÓRIO: A senhora é favorável ou contrária às atribuições do CNJ de punir os magistrados?
SUZANA DE CAMARGO GOMES: O CNJ é um órgão de fiscalização e também de planejamento. No meu entender ele precisa atuar nesses dois pontos, planejando o Judiciário e também fiscalizando o Judiciário, dando as linhas mestras e como o Judiciário há de se pautar.
A medida em que nós pensemos em transformar o CNJ num órgão sensório de todo e qualquer ato e de toda e qualquer falta de juiz, isso vai inviabilizar o próprio CNJ, porque ele perderá a sua função maior que é justamente de ditar o planejamento e uma fiscalização de maior abrangência.
É claro que sempre que ocorrer, por exemplo, uma omissão, que se perceber que está havendo uma forma de favorecimento a alguém ou uma inércia no sentido de julgar e de se punir eventuais falhas, é claro que cabe a atuação do CNJ. Mas há de ser subsidiária.
Em primeiro lugar, a corregedoria local e depois, num segundo ponto, não atuando a corregedoria a tempo e modo, é claro que se caberia ao CNJ. O que não pode é ele ficar com todas as questões, porque se ele ficar com todas, ele não terá a condição de desenvolver essa missão maior que é de planejamento e fiscalização do todo.

FATO NOTÓRIO: Ficha Limpa: o STF deve julgar procedente a Adecon ajuizada pela OAB ou há dispositivos inconstitucionais na Lei Complementar 135/2010?
SUZANA DE CAMARGO GOMES
: Nós temos que pensar em termos de aplicabilidade da norma. É claro que esta lei tem fundamento constitucional. Agora, ela não pode ser aplicada retroativamente.
A inconstitucionalidade da norma decorre da sua aplicação retroativa, de se colher situações e fatos anteriores à época da sua vigência. Por exemplo, considerar inelegível alguém que perdeu o mandato no passado, em razão de alguma punição, mesmo na órbita eleitoral, mas ao tempo em que a lei não estava em vigor, é algo incompatível com o ordenamento. É algo que refoge ao ordenamento porque representa uma retroatividade da norma e isso não é possível.
Eu acho louvável que se estabeleçam condições de moralidade, que se estabeleçam situações para só permitir que pessoas com bons antecedentes possam pleitear cargos públicos. Mas, não é possível a pessoa ser colhida de surpresa e ter um fato ao tempo que ocorreu não tinha essa consequência e acabar por ter uma consequência dessa natureza gravosa.


FATO NOTÓRIO: A decisão do STJ de autorizar o casamento civil de duas mulheres foi isolada ou é um importante precedente que se tornará entendimento jurisprudencial? A senhora pode revelar sua opinião pessoal?
SUZANA DE CAMARGO GOMES
: O Supremo no momento em que admitiu a união estável, ele sinalizou num sentido. No sentido que é compatível com o momento atual, que se reconhece a possibilidade dessas uniões.
Agora, o casamento propriamente com as consequências civis é um avanço da jurisprudência no sentido de criar uma situação jurídica nova. Não sei até que ponto teria o julgador essa possibilidade deste ativismo, mas acho extremamente louvável.
Mostra que o STJ está avançando e avançando numa posição de vanguarda.


FATO NOTÓRIO: Para finalizar: Ainda é “Tempo de Travessia”? O STJ será sua travessia?
SUZANA DE CAMARGO GOMES: Espero que seja, espero que eu consiga. Estamos aí nesta luta.

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