A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) extinguiu ação penal contra um guardador de carros do Rio Grande do Sul, que exercia a profissão irregularmente. Os ministros consideraram que a falta de registro no órgão competente não constitui justa causa para a propositura da ação.
O exercício da profissão de guardador e lavador autônomo de veículos é regulado pela Lei 6.242/75, que dispõe que tais ocupações, em todo o território nacional, dependem de registro na Delegacia Regional do Trabalho.
Ao exercer a atividade em via pública da cidade, o flanelinha foi denunciado pelo Ministério Público estadual por exercício ilegal da profissão. Na denúncia, o MP considerou que o cuidador de veículos infringiu o artigo 47 da Lei de Contravenções Penais (Lei 3.688/41), que prevê prisão simples ou multa para esses casos.
Prova negativa
De acordo com a denúncia, o flanelinha cuidava de veículos estacionados em via pública e recebia dinheiro pela atividade. No primeiro grau, o juiz rejeitou a denúncia, pois entendeu que não ficou comprovada a falta de registro no órgão competente e, por isso, não havia justa causa para a ação penal.
Inconformado com a decisão, o MP apelou para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que modificou a decisão. Para a corte, estavam descritos todos os elementos para o recebimento da inicial acusatória.
De acordo com o segundo grau, não poderia ser exigido do MP que fizesse prova negativa. Para o TJRS, não cabe à acusação comprovar que o denunciado não estava inscrito no órgão específico, pois essa prova caberia à defesa e não ao órgão acusatório.
Os desembargadores destacaram que o flanelinha possui cinco condenações pelos crimes de furto, roubo e porte de droga, e é reincidente.
Ônus da acusação
No STJ, a Quinta Turma reformou a posição do TJRS e confirmou o entendimento do primeiro grau. Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do habeas corpus, incide sobre o órgão de acusação “o ônus de demonstrar, ainda que minimamente, porém com fundamento de relativa consistência, os fatos constitutivos sobre os quais se assenta a pretensão punitiva”.
Os ministros explicaram que a Lei de Contravenções Penais teve a intenção de “garantir que determinadas profissões – que exigem conhecimento especial ou habilitação específica – sejam exercidas por profissionais habilitados, coibindo, desse modo, o abuso e a dissimulação em desfavor daqueles que acreditam estar diante de profissionais aptos”.
Perturbação mínima
Para o relator, a falta de registro no órgão competente configurou “perturbação social de ordem mínima, que não justifica a intervenção do direito penal, podendo ser resolvida, sem dificuldades, no âmbito administrativo”. Basta que o acusado providencie a inscrição na Delegacia Regional do Trabalho.
Bellizze esclareceu que a restrição de direitos do indivíduo apenas se justifica “quando estritamente necessária à proteção da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais”.
A Turma não descartou que os guardadores ou lavadores de veículos possam ser responsabilizados no âmbito criminal. Segundo os ministros, isso pode acontecer se, “a pretexto de exercer a profissão, o agente exigir do motorista, mediante violência ou ameaça explícita ou implícita, o pagamento para estacionar em via pública, demonstrando-se, ainda, que o valor cobrado não se refere à vigilância, mas ao preço para não ter o bem danificado”.
Tal conduta, de acordo com os ministros, poderia ser incluída nos tipos penais relativos à extorsão, constrangimento ilegal e outros. Porém, o caso denunciado é de exercício de profissão sem inscrição no órgão específico.
Para o colegiado, a denúncia não veio acompanhada de elementos mínimos capazes de atrair a incidência do tipo penal. Por isso, a Quinta Turma extinguiu a ação contra o guardador de carros, em virtude da “patente falta de justa causa”.
Processo: HC 190186
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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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