"Quem acusar com seriedade, verá o seu clamor ajudando na construção de um País mais justo; quem o fizer de forma irresponsável, se submeterá às sanções penais e civis correspondentes".
Antonio Sbano
Presidente da Anamages
O Brasil da insegurança jurídica e do casuísmo. STF X CNJ X SENADO. A constituição ainda está vigente, ou se interpreta, emenda e remenda, à luz de interesses e paixões?
*Antonio Sbano, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais.
Vivemos dias tormentosos e de crescente insegurança jurídica, com grave ameaça ao estado de direito e à própria democracia.
Crise entre os Poderes constituídos, denúncias diárias de corrupção e de desmandos mil; afrouxamento da legislação penal e processual penal, com o crescer vertiginoso da marginalidade transformada, segundo alguns, em “vítimas da sociedade”, enquanto o cidadão de bem se torna presidiário em sua casa e, paralelamente, roubos cinematográficos com a impotência do Estado em fazer frente ao estado de verdadeira guerrilha que se instala com a ação do tráfico e de bandos organizados.
Pelo andar da carruagem, em breve alguém apresentará proposta de emenda à constituição para mudar o nome de nosso amado País de Brasil para Babel Tupiniquim, capital Sodoma!
Em passado recente, a Justiça colocou um freio ao inchaço das Câmaras Municipais. O Congresso, com celeridade invejável, editou lei permitindo que a “festança” continue. Quase todos os Municípios estão aumentando o número de seus Vereadores. Para que, se o governo diz faltar recursos para educação, saúde, segurança e, até, pasme-se, para cumprir com outro dever constitucional: repor a inflação a corroer os subsídios do setor público?
A insegurança se instala: o Supremo decide dentro de suas limitações constitucionais; o Congresso, por vias transversas, muda a constituição como forma de tornar ineficaz a decisão judicial; em outras oportunidades, o Supremo se omite ou se coloca na posição de negociador político, quando sua atuação deve ser exclusivamente técnica!
A norma constitucional, regra político-social que deveria reger a conduta de todos nós brasileiros, governantes e governados, já não mais se interpreta pelo que nela se contém e expressa a vontade do legislador constituinte originário, eleito exatamente para redigir o nosso pacto social, mas, apenas e tão, pelo que interessa a segmentos do governo, como um todo.
Aflorou, e está na mídia diária, crise entre o pensamento de parte do STF e parte do CNJ, quanto a competência deste. A pendenga ultrapassou os umbrais do Judiciário e deságua no Legislativo que, mais uma vez, de forma rápida, apresenta, a PEC 97/2011 (Senado) dando super poderes ao Conselho Nacional de Justiça, isto ás vésperas do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, julgar uma ação Direta de Inconstitucionalidade para dizer se a ação do Conselho é concorrente ou subsidiária a dos tribunais.
Enfim, se a Justiça interpreta a constituição vigente, o Congresso, não gostando, a modifica e pronto!
Acabou-se a segurança jurídica, o estado de direito e a vontade popular externada na redação original da Carta da República. Valem as paixões do dia e o interesse de se transformar o País em um regime ditatorial em que a única vontade é do grupo que está no Poder, ignorando, pisoteando e rasgando a própria Constituição.
A celeuma criada em torno da matéria, cai no vazio se a matéria for avaliada tecnicamente, os espíritos se despirem de vaidade e se pensar no interesse do povo brasileiro.
É necessário se por freio aos desmandos e desvios de conduta, em todos os segmentos sociais. É necessário se apurar com rigor as infrações penais e administrativas, punindo-se de forma exemplar seus autores e, até mesmo, aplicando penas mais exarcebadas aos agentes políticos, dos Três Poderes, que se afastem do caminho do bem. Isto é consenso popular e nacional.
O que não se pode aceitar é o rompimento dos princípios pétreos e basilares da República para atender reclamos meramente populistas e midiáticos.
A Constituição garante aos tribunais o poder de auto organização, é base do princípio federativo. De outro, lado, não se pode aceitar que a inércia assentada no corpotativismo (e este está presente nos Três Poderes), leve à impunidade.
Os tribunais, ao longo dos anos se omitiram, dando azas a que se instituísse o Conselho Nacional de Justiça. Por outro vértice, o sistema legal brasileiro garante a qualquer bandido o duplo grau de jurisdição, ao magistrado, apenas um, isto é, julgado em seu tribunal, se condenado ou absolvido, nada mais se poderá fazer.
O sistema precisa ser modificado, as atribuições do Conselho precisam ser melhor delineadas, mas com respeito ao pacto federativo.
Reitero o que já tenho escrito em outras oportunidades, precisamos achar o meio termo, o ponto de equilíbrio, sem violar a Carta Política com emendas e remendos desvairados, de sorte a dar ao Conselho a segurança jurídica de que precisa para agir, com respeito ao devido processo legal, a ampla defesa e ao contraditório.
Correta a PEC quando defere foro especial aos Membros do Conselho e as ações contra o Conselho, matéria hoje sem regulamentação e não se pode conceber que exercendo o Conselheiro uma função relevante, seja ele julgado por aqueles a quem julga, é a inversão total dos princípios da hierarquia, ainda que ela em sentido funcional não se faça presente.
Deve se respeitar a competência constitucional dos tribunais, sem se editar regra que irá colidir com outra norma da própria Constituição. A mais, precisa-se colocar um balizamento para impedir a ação omissiva de alguns tribunais. E a omissão corporativista não existe apenas no Poder Judiciário!
A magistratura, ainda que organizada funcionalmente em segmentos diversos, é uma instituição nacional, como se tem assentado na farta jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. E, assim, se impõem regras de caráter nacional para disciplinar o procedimento investigatório e disciplinar, respeitando-se, repita-se, o pacto federativo.
Como conciliar todas as vertentes de pensamento com o texto Maior vigente?
É algo simples e que se transformou em verdadeiro cavalo de batalha, sem razão de ser.
- Conceda-se ao cidadão o direito de apresentar sua denúncia embasada em provas ou, pelo menos, com indicação de onde se pode obtê-las, no tribunal ou no Conselho.
- Defira-se prazo rígido e razoável para que o tribunal delibere se a denúncia é séria e merece apuração ou não, de tudo dando ciência ao Conselho em prazo pré-fixado, sob pena de responsabilidade da autoridade.
- Instaurado procedimento disciplinar, fixe-se prazo para sua conclusão, sob pena de responsabilidade sempre que houver injustificado desrespeito aos prazos estipulados.
- Decorrido os prazos, e tais procedimentos não devem demorar mais que 180 dias em toda sua tramitação, estipule-se que o Conselho avocará, de ofício ou mediante provocação do interessado, a sindicância ou o procedimento para seu processamento e julgamento, sempre que houver desrespeito aos prazos fixados ou a decisão for manifestamente contrária a prova dos autos.
- Sempre que ao magistrado for aplicada pena de aposentadoria compulsória ou de disponibilidade, imponha-se a obrigatoriedade do órgão julgador encaminhar cópia do processo ao Ministério Público e a Procuradoria da União ou do Estado para as providências cabíveis (perda do cargo).
- Da mesma forma, quando dos autos houver indícios da
prática de crime, se envie cópia do procedimento ao Ministério Público para propositura da ação penal. - Por fim, permita-se que tanto o magistrado, quanto o denunciante, possa recorrer da decisão do tribunal para o Conselho ou recorrer, quando se tratar de julgamento em única instância, para o Supremo Tribunal Federal.
- Por que aumentar o prazo prescricional para se iniciar a revisão de um para cinco anos, se o próprio Conselho, em seu Regimento Interno, entendeu ser um ano o suficiente?
São medidas simples, algumas por mera alteração da Resolução 135 e outras a depender de PEC, que respeitam o princípio federativo, não ferem a autogestão e organização dos tribunais e conferem poderes certos, determinados e inquestionáveis ao Conselho Nacional de Justiça.
Para a magistratura, em especial a de 1º grau, ficará a sensação, e certeza, que serão julgados com imparcialidade em razão de se instituir, em seu favor, a duplicidade de instância hoje inexistente; ao cidadão, ficará a certeza de que, se houver corporativismo no tribunal, ele poderá se valer de uma nova instância para levantar a sua voz.
Quem acusar com seriedade, verá o seu clamor ajudando na construção de um País mais justo; quem o fizer de forma irresponsável, se submeterá às sanções penais e civis correspondentes.
Por fim, que este mesmo clamor contra a impunidade leve à reflexão e adoção de medidas similares nos demais Poderes, inclusive criando-se regras processuais mais dinâmicas para que os processos penais contra os que ferem a ordem legal aproveitando-se de seus cargos, possam ser punidos com a celeridade desejada pela população, sem prejuízo à ampla defesa.
Os magistrados estaduais não desejam, não compactuam, não admitem e não aceitam impunidade ou desrespeito aos direitos e garantias constitucionais, seja sob que argumento for. Querem, sim, o aperfeiçoamento das instituições com estrito respeito e cumprimento da Constituição da República Federativa do Brasil.
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