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27/04/2011

A Ética na Formação do Magistrado


Francisco de Assis Filgueira Mendes
Desembargador do TJCE





Trechos do artigo: "A Ética na Formação do Magistrado", da autoria do magistrado Francisco de Assis Filgueira Mendes, publicado na revista THEMIS (Fortaleza, v 3, n. 1, p. 191 - 200, 2000) da ESMEC (Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará), cujo texto foi elaborado para intervenção oral, no III Congresso Internacional da Justiça – Preparando a Justiça para o 3º milênio – Fortaleza-Ce, de 8 a 11 de dezembro de 1999, promoção da Associação Cearense de Magistrados:

 
Uma das conclusões do “Primeiro Colóquio Internacional da Magistratura” (realizado em 1996) apontava:
"Não é proibido sonhar com o juiz do futuro: Cavalheiresco, hábil pra sondar o coração humano, enamorado da Ciência e da Justiça, ao mesmo tempo que insensível às vaidades do cargo; arguto para descobrir as espertezas dos poderosos do dinheiro; informado das técnicas do mundo moderno, no ritmo desta era nuclear, quando as distâncias se apagam e as fronteiras se destroerm, quando, enfim, as diferenças entre os homens logo serão simples e amargas lembranças do passado".

Uma vez apoiado em suas necessidades técnico-instrumentais, o juiz não pode prescindir de independência. O desembargador Raimundo Bastos de Oliveira, Diretor Geral da Escola da Magistratura do Estado do Ceará, do alto de uma longa vida de magistrado, resume tudo num desabafo simples:

Deixem o Juiz julgar!

Em seu livro “Poder Judiciário – Crises, acertos e desacertos”, Eugênio Raul Zaffaroni verbera: A independência do juiz, ao revés, é a que importa a garantia de que o magistrado não estará submetido às pressões de poderes externos à própria magistratura, mas também implica a segurança de que o juiz não sofrerá as pressões dos órgãos colegiados da própria judicatura.
Um juiz independente, ou melhor, um juiz, simplesmente, não pode ser concebido em uma democracia moderna como um empregado do executivo ou do legislativo, mas nem pode ser um empregado da corte ou do supremo tribunal. Um poder judiciário não é hoje concebível como mais um ramo da administração e, portanto, não se pode conceber sua estrutura na forma hierarquizada de um exército. Um judiciário verticalmente militarizado é tão aberrante e perigoso quanto um exército horizontalizado.

E continua:
A pressão sofrida pelos juízes em face de lesão à sua independência externa, em um país democrático, é relativamente neutralizável, por via da liberdade de informação, de expressão e de crítica, mas a lesão de sua independência interna é muito mais contínua, sutil, humanamente deteriorante e eticamente degradante. Quanto menor seja o espaço de poder de uma magistratura, quer dizer, quanto menor independência externa possua, maior parece ser a compensação buscada pelos seus corpos colegiados no exercício tirânico de seu poder interno. Em uma magistratura com estes vícios, é quase impossível que seus atos sejam racionais.

(...)

De todo modo, para perseguir esse ideal ético-profissional, estou convicto
de que cada ser-juiz precisa:
- Abjurar a presunção de divindade, assumindo, mais e mais, sua condição
humana falível e limitada, mas capaz de plenificar-se e ultrapassar-se;
- Assumir, a cada passo, o direito de sonhar e de ousar, fugindo à rigidez
cartesiana, a fim de poder acompanhar as mutações da vida;
- Cultivar a virtude da humildade, ciente da sua função de agente de um
Poder cuja soberania deve ser devolvida ao seu destinatário, o povo;
- Preservar e defender, interna e externamente, sua independência
operacional;
- Não olvidar que, em qualquer processo, circulam vidas, sangue, lágrimas,
necessidades existenciais próprias das carências humanas, e isso determina
que as decisões não sejam proferidas com cinzéis e martelos, como se
fossem gravadas em pedras graníticas.

Prefiro, assim, finalizar com uma admonição pesada e preocupante, criada
pelo espírito inquieto e brilhante do escritor lusitano José Saramago:

O Cristo do Corcovado desapareceu, levou-o Deus quando se retirou
para a Eternidade, porque não tinha servido de nada pô-lo ali. Agora, no lugar
dele, fala-se colocar quatro enormes painéis virados às quatro direções do Brasil e do mundo, e todos, em grandes letras, dizendo o mesmo:

‘UM DIREITO QUE RESPEITE, UMA JUSTIÇA QUE CUMPRA’.






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