(Foto: STJ)
Adilson Vieira Macabu
(Desembargador do TJ/RJ, convocado pelo STJ, a partir de dezembro de 2010. Membro da Terceira Seção e da Quinta Turma).
STJ - Rec. Esp. 962.078 - Rel.: Min. Adilson Vieira Macabu
1. O condenado tem o dever e o direito de trabalhar garantidos pela Constituição Federal e pela legislação específica. 2. Assim, em virtude da particularidade do caso ora em análise, qual seja - tendo o Réu encontrado emprego em comarca diversa e distante daquela onde deveria cumprir sua pena, há de ser mantido seu direito à prisão domiciliar, não se aplicando o disposto no art. 117 da LEP. 3. É consabido que o apenado também é um sujeito de direitos e que o objetivo principal da pena, na moderna concepção de Estado democrático de direito, é a sua ressocialização e não o seu banimento nefasto do convívio em sociedade.
EMENTA OFICIAL: Execução penal. Recurso especial. Regime semiaberto. Apenado trabalha em Comarca diversa daquela em que deve cumprir a pena. Possibilidade da prisão domiciliar. Peculiaridade do caso concreto. Fins sociais da pena. Ressocialização e condições pessoais do detento. Violação ao art. 117 da LEP não configurada. Princípio da razoabilidade. Divergência jurisprudencial indemonstrada.
1. O condenado tem o dever e o direito de trabalhar garantidos pela Constituição Federal e pela legislação específica.
2. Assim, em virtude da particularidade do caso ora em análise, qual seja - tendo o Réu encontrado emprego em comarca diversa e distante daquela onde deveria cumprir sua pena, há de ser mantido seu direito à prisão domiciliar, não se aplicando o disposto no art. 117 da LEP.
3. É consabido que o apenado também é um sujeito de direitos e que o objetivo principal da pena, na moderna concepção de Estado democrático de direito, é a sua ressocialização e não o seu banimento nefasto do convívio em sociedade.
4. Não havendo o recorrente demonstrado, mediante a realização do devido cotejo analítico, a existência de similitude das circunstâncias fáticas e o direito aplicado nos acórdãos mencionados e paradigmas, resta desatendido o comando do art. 255 do RISTJ.
5. Recurso desprovido.
Rec. Esp. 962.078 - RS (2007/0139871-1) – Rel.: Min. Adilson Vieira Macabu (Des. Convocado Do TJ/RJ) - Recorrente: Ministério Público Do Estado Do Rio Grande Do Sul - Recorrido: Leonardo Beulk (Advogado: Léa Brito Kasper - Defensora Pública E Outros) – J. Em 17/02/2011 - DJe 21/03/2011 – 5ª T. - STJ.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Senhores Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, em conhecer do recurso, negando-lhe provimento. Os Srs. Ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho.
Brasília, 17 de fevereiro de 2011(Data do Julgamento)
MINISTRO ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ) - Relator
Relatório (...)
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ) (Relator):
Conforme relatado, sustenta o recorrente ofensa ao art. 117 da LEP, ante a concessão de prisão domiciliar fora das hipóteses legais expressamente estabelecidas.
Da análise dos autos, verifica-se que o recorrido cumpre pena de reclusão de 7 anos e 3 meses, em regime semiaberto, pela prática de roubo e furto qualificado (fls.49).
O apenado deveria cumprir pena na Comarca de Espumoso, tendo conseguido emprego, no entanto, na cidade de Colorado, o que o fez postular a prisão domiciliar que, concedida pelo juízo monocrático, foi mantida em sede de agravo em execução, em decisão assim ementada, verbis:
«EXECUÇÃO PENAL. REGIME SEMI-ABERTO. TRABALHO EXERCIDO PELO APENADO EM CIDADE DISTANTE DA COMARCA DO JUÍZO DE EXECUÇÃO. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO À CASA PRISIONAL APENAS NOS FINAIS DE SEMANA MANTIDA. IMPOSIÇÃO DE PRISÃO DOMICILIAR DURANTE OS DIAS DA SEMANA. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO DIREITO DE ACORDO COM AS CIRCUNSTÂNCIAS DE MODO A VIABILIZAR A FINALIDADE PRECÍPUA DA EXECUÇÃO PENAL, DE 'HARMÔNICA INTEGRAÇÃO SOCIAL' (ART. 1º DA LEP). Agravo parcialmente provido.» (e-STJ fls. 182)
É certo que o trabalho é um direito fundamental de qualquer cidadão brasileiro, garantido pelo art. 6º da Magna Carta:«São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.» (Grifei).
Por outro lado, a Lei de Execuções Penais determina que o labor é, não só um dever, como um direito do apenado:
«Art. 28. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.
Art. 31. O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidade.
Art. 41 - Constituem direitos do preso:
(...)
II - atribuição de trabalho e sua remuneração»
O que nos leva à conclusão de que o condenado em razão da legislação aplicável, tem garantido o seu direito de trabalhar, além de possuir a obrigação de fazê-lo, como meio de promover a cidadania e a sua ressocialização, objetivo principal da pena na moderna concepção de Estado democrático de direito, ou seja, ele também é um sujeito de direitos e a função social da pena é a sua ressocialização e não o seu banimento nefasto do convívio em sociedade.
O acórdão impugnado manteve a decisão primeva, aduzindo que:
«...omissis...
Em qualquer regime o trabalho constitui direito-dever do preso e deve ser compatibilizado com o cumprimento da pena privativa de liberdade.
Negar ao apenado o direto de apresentação semanal fazendo com que perca o trabalho, meio de sustento, em grave situação de desemprego geral, implicaria exacerbação da pena e desvio do objetivo primordial da execução, de propiciar harmônica integração social do condenado (art. 1º, da LEP).
Para que a liberação não fique incondicionada, é possível e necessário aplicar por analogia, excepcionalmente, as regras dos arts. 115 a 117 da LEP, impondo-se ao apenado a prisão domiciliar semanal, além do recolhimento à casa prisional nos finais de semana. » (e- STJ fls. 184)
Aliás, esse é o mesmo entendimento adotado no parecer do Ministério Público Federal, que pode ser assim sintetizado:
«EXECUÇÃO DA PENA - TRABALHO EXTERNO - REGIME SEMIABERTO E PRISÃO ALBERGUE DOMICILIAR (art. 117 da Lei 7.210/84) 1) O art. 117 da LEP, que dispõe sobre a prisão albergue domiciliar, não a prevê para a hipótese de sentenciado em cumprimento de pena em regime semiaberto e exercendo trabalho externo com vínculo empregatício. 2) O artigo 1º da LEP, a par de estabelecer que ' a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições da sentença ou decisão criminal', também preconiza que é sua finalidade 'proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.» 3) Demonstrada, no caso concreto, a impossibilidade ou extrema dificuldade de se conciliar o trabalho com o regime semiaberto de cumprimento da pena, não ofende o art. 117 da LEP a concessão da denominada prisão albergue domiciliar ao sentenciado, já que, apesar de aparente colidência com esse dispositivo legal, a solução acaba por se compatibilizar com outras normas da mesma lei. Parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso. ...omissis...
6. A decisão do Juízo da Execução está assim fundamentada: '[...]
Compareceu a este Juízo o apenado Leonardo Beulk, dizendo, em síntese, não possuir condições financeiras de deslocar-se diariamente ao município de Espumoso, haja vista encontrar-se laborando na cidade Colorado.
Evidente é a escassez de vagas no mercado de trabalho em nosso país. De notar, que o apenado está devidamente empregado em atividade lícita, a qual exerce na cidade de Colorado/RS. Nã considerar o pedido do reeducando significaria deixar-lhe à míngua, uma vez que o gasto com o deslocamento diário importa em quase todo o montante de sua renda.
[...].
Isto posto, tenho por conceder ao reeducando a apresentação semanal, devendo para tanto, apresentar-se na Casa Prisional às 12 horas do sábado, e lá permanecendo até às 07 30 min da manhã de segunda-feira, bem como feriados.' (e- STJ fls. 225/228)
Assim, a decisão ora recorrida, ao conceder a prisão domiciliar, não importou em ofensa à lei federal e nem dissentiu da jurisprudência desta Corte Superior, que tem adotado o entendimento no sentido de ser possível a permissão do cumprimento da pena em regime domiciliar, em casos excepcionais, que diferem do elencado no art. 117 da LEP, hipótese dos autos.
Importante ressaltar que, em razão da peculiaridade do caso concreto, visando a ressocialização do condenado e levando em consideração suas condições pessoais, entendo que é possível enquadrá-lo como exceção das hipóteses discriminadas no dispositivo legal tido como violado.
Dessa forma, não há se falar em violação ao art. 117 da Lei 7.210/84.
Por outro lado, o recorrente, malgrado a tese de dissídio jurisprudencial, não realizou o necessário cotejo analítico, que não se satisfaz pela mera transcrição de ementas ou trechos de votos, não restando demonstradas, assim, as circunstâncias identificadoras da divergência entre o caso confrontado e os arestos paradigmas.
Ademais, é pacífico o entendimento segundo o qual «para apreciação do recurso especial com base em aventado dissídio pretoriano impõe-se que teses jurídicas antagônicas tenham incidência em situações concretas de absoluta similitude fática, evidenciada mediante o cotejo analítico estabelecido entre o aresto recorrido e o paradigma indicado» (EDcl no REsp 731.510/MA, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, DJe 9/3/2009).
Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA
Registro: 2007/0139871-1 - PROCESSO ELETRÔNICO - REsp 962.078 - RS - Origem: 14215 14582 16902 17033 20100001061 20300010227 20400000451 2050000 20500009060 70018799437 - MATÉRIA CRIMINAL - PAUTA: 17/02/2011 - JULGADO: 17/02/2011 - Relator Exmo. Sr. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ) - Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI - Subprocuradora-Geral da República Exma. Sra. Dra. LINDÔRA MARIA ARAÚJO - Secretário Bel. LAURO ROCHA REIS
ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra o Patrimônio - Roubo
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: «A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso, mas lhe negou provimento.» Os Srs. Ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho.
Fim do documento: (LegJur - Base de Dados 2000 - 2011)
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