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25/08/2011

STF - liberdade provisória no crime de tráfico de drogas



Presa preventivamente por tráfico de drogas obtém liberdade com restrições
Por votação unânime, a Segunda Turma concedeu, nesta terça-feira (23), com restrições, a ordem de soltura a A.F.B., presa há mais de nove meses por ordem do juiz da 4ª Vara Criminal de Campo Grande (MS), sob acusação de tráfico de entorpecentes e associação para o tráfico (artigos 33 e 35 da Lei 11.343/2006).


Na decisão, tomada no julgamento do Habeas Corpus (HC) 108990, relatado pelo ministro Gilmar Mendes, os ministros presentes à sessão entenderam que o juiz de primeiro grau não fundamentou suficientemente a decisão de manter A.F.B. presa, negando pedido de concessão de liberdade provisória formulado pela defesa.


A Turma considerou, ainda, o fato de A.F.B. estar grávida quando foi presa e, ao contrário do que alegou o juiz ao negar a ordem provisória, possuir, sim, residência fixa. Prova disso, conforme alegou a Defensoria Pública da União (DPU), que atuou em defesa da acusada, foi o fato de ela ter sido presa em casa e o juiz ter indicado o endereço residencial para citação no processo.


Por fim, a Turma levou em conta, também, o fato de a quantidade de droga apreendida em poder de A.F.B. (10,7 gramas de pasta de coca) ser pequena. Isso seria indício de uma pena também reduzida, com possibilidade de o juiz da causa vir a converter a pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. Também pesou o fato de o processo não ter sido julgado no mérito, até hoje, pelo juiz de primeiro grau.


A defesa também refutou alegação do juiz de primeiro grau de que A.F.B. faria parte de um grupo organizado, dedicado ao tráfico de drogas. Lembrou que ela foi presa na companhia de apenas uma pessoa e assegurou que ela não integra nenhum grupo.


Presa em Mato Grosso do Sul, A.F.B. teve negado pedido de liberdade provisória pelo juiz da causa. Em seguida, HCs com o mesmo pedido foram denegados, sucessivamente, pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).


Restrições


A ordem de soltura de A.F.B. foi concedida com cláusulas a serem observadas, nos termos do artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP), na redação que lhe foi dada pela Lei 12.403/2011. Tal dispositivo permite que o juiz da causa defina outras medidas cautelares a serem observadas, que não a restritiva de liberdade. Entre elas está a de atender a todas as convocações da Justiça. Caberá, portanto, ao juiz de primeiro grau fixar tais condições.


FK/CG


 


Comentários de Patrícia Donati de Almeida
 Advogada. Pós-Graduada em Direito Processual Civil. Coordenadora Pedagógica - Produtos WEB da Rede LFG

A discussão sobre o cabimento ou não de liberdade provisória no delito de tráfico é alvo de nova discussão e decisão pela nossa Suprema Corte. Afirmar, simplesmente, que não é possível a concessão de liberdade provisória no crime de tráfico de drogas, em razão da existência de expressa vedação legal é, no mínimo, um absurdo.

A decisão objeto de estudo fora proferida em sede do HC de n° 108990, em face ao entendimento firmado pela Quinta Turma do STJ.

Não é a primeira e não será a última vez que tratamos do tema. A nossa intenção não é a de ser repetitivos, mas, sim, evidenciar a necessidade de posicionamento definitivo sobre tema, haja vista o mesmo relacionar-se, diretamente, com um dos direitos mais importantes do ser humano: a liberdade.

Ora, o indivíduo não pode ficar a mercê das instâncias inferiores do Poder Judiciário, até que se chegue ao STF para o seu direito ser reconhecido. O raciocínio é simples: a vedação legal não deve ser o único fundamento para não reconhecer o direito à liberdade provisória no crime de tráfico. Razões outras devem estar presentes, no caso concreto, para que a sua concessão não ocorra.

Das inúmeras decisões que analisamos sobre a matéria, a grande maioria seguiu a mesma sistemática: não aplicação do benefício pela instância de primeiro grau, por determinados Tribunais de Justiça e, quando análise é feita pela Quinta Turma do STJ, o raciocínio é mantido.

Para os Ministros dessa Turma do Tribunal da Cidadania, os crimes contemplados nos arts. 33, caput e § 1°, e 34 a 37 da nova lei de tóxicos "são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos" (art. 44 da Lei nº 11.343/06). Embora tenha a lei 11.464/07 suprimido do texto legal do art. 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90 a vedação à concessão de liberdade provisória aos acusados por crimes hediondos e equiparados, remanesce a proibição tendo em vista a especialidade da nova lei de tóxicos. Além do mais, o art. 5º, inciso XLIII, da Carta Magna, proibindo a concessão de fiança, evidencia que a liberdade provisória pretendida não pode ser concedida.

Analisemos a evolução legislativa que acompanhou o tema:

Lei 8.072/1990 (lei dos crimes hediondos): art. 2°, II vedava, expressamente, a liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados (tráfico é crime equiparado a hediondo)

Lei 11.343/2006 (‘nova’ Lei de Drogas): manteve a proibição expressa em seu art. 44

Lei 11.464/2007: ao conferir nova redação ao art. 2° da Lei 8.072, suprime por completo, tal proibição

Tal realidade contempla o cenário da sucessão de leis. E, o princípio solucionador a ser aplicado é o da posterioridade. Deve-se compreender que, tacitamente, ao alterar o art. 2° da Lei 8.072, a Lei 11.464 acabou por tacitamente revogar a proibição trazida pelo art. 44 da Lei 11.343, por ser com ela, completamente incompatível.

Desta feita, o que se evidencia entre as Leis 11.464/2007 (nova lei geral dos crimes hediondos e equiparados) e Lei 11.343/2006 (lei de drogas) é, exatamente, a relação de posterioridade e revogação.

Esse é, a nosso ver, a correta compreensão da matéria. Mas, mesmo que não seguida por alguns dos órgãos judicantes do nosso Poder Judiciário, ou seja, ainda que se entenda vigente a proibição do art. 44 da Lei 11.343/2006, salientamos que o magistrado não pode tê-la como único fundamento (completamente abstrato) para o indeferimento da liberdade provisória, aos crimes de tráfico, devendo, sim, analisar o caso concreto, para fundamentar (concretamente) a não concessão do benefício.

Por fim, ressaltamos que esse raciocínio pode ser aplicado sem riscos, podendo o magistrado, ao conceder a liberdade, valer-se das novas medidas cautelares (alternativas à prisão), trazidas pela Lei 12.403/2011.

A decisão proferida pela Segunda Turma do STF revela como a Suprema Corte brasileira vem se preocupando em acompanhar a efetiva evolução do Direito e, principalmente, em se valer de institutos outros que a prisão, que deve ser a ultima ratio, quando realmente indispensável.


LUIZ FLÁVIO GOMES*


“Por votação unânime, a Segunda Turma concedeu, no dia 23.08.11, com restrições, a ordem de soltura a A.F.B., presa há mais de nove meses por ordem do juiz da 4ª Vara Criminal de Campo Grande (MS), sob acusação de tráfico de entorpecentes e associação para o tráfico (artigos 33 e 35 da Lei 11.343/2006).” (STF, HC 108.990).


Mas cabe liberdade provisória nos crimes hediondos ou equiparados? A resposta dada pelo STF é positiva. Nesse mesmo sentido opinamos no nosso livro “Prisão e Medidas Cautelares” (RT, 2011).


Os ministros presentes à sessão “entenderam que o juiz de primeiro grau não fundamentou suficientemente a decisão de manter A.F.B. presa, negando pedido de concessão de liberdade provisória formulado pela defesa.”


Presa em Mato Grosso do Sul, A.F.B. teve negado pedido de liberdade provisória pelo juiz da causa. Em seguida, HCs com o mesmo pedido foram denegados, sucessivamente, pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).


Restrições


“A ordem de soltura de A.F.B. foi concedida com cláusulas a serem observadas, nos termos do artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP), na redação que lhe foi dada pela Lei 12.403/2011. Tal dispositivo permite que o juiz da causa defina outras medidas cautelares a serem observadas, que não a restritiva de liberdade. Entre elas está a de atender a todas as convocações da Justiça. Caberá, portanto, ao juiz de primeiro grau fixar tais condições.”


*LFG – Jurista e cientista criminal. Jurista e cientista criminal. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

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