Delaíde Miranda Alves superou dificuldades para se formar e conquistar vaga de magistrada
Gustavo Gantois, do R7, em Brasília
(Agência Senado)
Delaíde prega investimento em educação
O gabinete de 70 m² com vista para o Lago Paranoá em nada se parece com a casa humilde retratada nas fotografias sobre a mesa da ministra Delaíde Miranda Alves, do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Mas elas estão ali para lembrá-la pelo que teve de passar até chegar a um lugar que jamais pensou que alcançaria.
Aos 59 anos, Delaíde começou a carreira na cidade de Pontalina, a 130 km de Goiânia, como empregada doméstica. Carreira é o termo mais apropriado porque para esta mulher, que faz aniversário justamente no Dia do Trabalhador, a labuta na roça moldou todo o entendimento profissional de sua vida.
- Sou uma magistrada privilegiada porque conheço a realidade. Não sou apenas uma pessoa que estudou, se debruçou nos livros e atravessou barreiras. Além da formação teórica, pude advogar para empregados, empresas e ter o conhecimento em campo do que é a realidade de uma pessoa que tem uma meta e cuja meta é vencer barreiras.
Delaíde nasceu na roça goiana, como gosta de dizer. Ajudava o pai na lavoura, colocando a mão na terra para plantar milho e feijão. Aos 14, decidiu que não podia ficar mais ali e foi terminar o ensino fundamental na cidade. Trabalhou por um ano e meio como doméstica e dois anos como recepcionista no consultório de um médico, o mesmo médico que alguns anos depois a incentivaria a tentar a vida em Goiânia.
- Ele me achava inteligente, estudiosa e dizia que eu tinha de ir para Goiânia para fazer o curso normal, para ser professora. Eu adoro a profissão, respeito os professores, mas a minha profissão sempre foi ser advogada.
Aos 18 anos, já em Goiânia, voltou a trabalhar como doméstica. Com a ajuda do médico, que era casado com uma prima, conseguiu emprego na casa de outra família. Ganhava cama e comida em troca de serviços domésticos. Enquanto isso, estudava e lia tudo o que estivesse ao seu alcance.
Cinco anos depois passou no vestibular para direito em uma faculdade particular. Conseguiu uma bolsa no antigo crédito educativo. O governo pagava as mensalidades diretamente à universidade e Delaíde teria 48 meses de carência para começar a quitar.
Com o ensino superior vieram mudanças bruscas. Trocou o trabalho doméstico por um estágio em um escritório de advocacia. Apaixonou-se pelo direito trabalhista, ao qual chama de segundo casamento.
O primeiro veio dois anos após entrar na faculdade, quando conheceu o atual marido, Aldo Arantes. Ex-deputado federal, Arantes foi presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) poucos anos antes da ditadura militar (1964-1985). Do casamento, vieram duas filhas e um neto, de 11 anos.
Direito
A paixão de Delaíde pelo direito começou ainda em Pontalina. Antes mesmo de lidar com os escovões e vassouras nas casas onde trabalhou, a então menina gostava de assistir aos julgamentos no tribunal da cidade.
- No interior não tem muita opção. Não tinha peça de teatro, não tinha cinema, e uma coisa no interior que é muito forte, ainda hoje, são as sessões do júri. A cidade inteira assiste. Tenho a impressão que eu fui influenciada a fazer direito por assistir a esses júris, pelo aspecto teatral daquilo tudo.
À reportagem do R7, a ministra confidenciou uma passagem de sua vida que nunca revelou publicamente. Em uma das sessões do júri, deparou-se com um tio seu que estava sendo julgado por homicídio.
- Eu tinha mais ou menos uns seis anos. Foi um crime banal. Uma pessoa assassinou uma tia minha, irmã do meu pai, e esse meu tio vingou a morte da minha tia. Era muito comum antigamente, chamam de crime de vendeta [vingança]. Esse tio foi a júri por três vezes e absolvido nas três vezes por 7 a 0. Eu assistia a esses júris e achava tudo um espetáculo.
Trabalho
Após cursar a faculdade, Delaíde mergulhou na profissão. Estagiou e em pouco tempo abriu o seu próprio escritório de advocacia, especializado em relações trabalhistas, e que hoje é tocado pelas filhas. Por 30 anos lidou com todos os tipos de clientes, de empregadas domésticas, como ela fora, até grandes empresas.
A base que adquiriu foi suficiente para ser indicada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para ocupar uma vaga no TST. E foi a própria presidente Dilma Rousseff quem decidiu escolher o nome de Delaíde.
No mesmo gabinete espaçoso, as estantes ainda não estão todas ocupadas. De acordo com a ministra, parte da biblioteca está em casa e outra parte ainda em Goiânia. A parte que cabe ao escritório ainda não havia chegado até o dia da entrevista. As gavetas, no entanto, estão entupidas. Delaíde conta que tomou posse no dia 24 de março com 11 mil processos à sua espera.
- Em Goiás, as varas do trabalho, que são mais de 30, têm em média 2.000 cada uma. Mas não posso reclamar. Considero que não posso fazer um esforço concentrado no sentido de diminuir apenas volume. Preciso aliar o julgamento dos processos à qualidade do trabalho. São 11 mil vidas atrás dos processos. São 11 mil pessoas e 11 mil empregos que dependem de uma decisão minha.
Para dar conta do trabalho, a ministra chega ao tribunal entre 8h e 8h30 e não sai antes das 20h, podendo estender a jornada até as 22h. São de 12 a 14 horas de trabalho diárias, mas nada que se compare àquela rotina de doméstica nos idos de 1950, quando labutava em Pontalina.
Aos 59 anos, Delaíde começou a carreira na cidade de Pontalina, a 130 km de Goiânia, como empregada doméstica. Carreira é o termo mais apropriado porque para esta mulher, que faz aniversário justamente no Dia do Trabalhador, a labuta na roça moldou todo o entendimento profissional de sua vida.
- Sou uma magistrada privilegiada porque conheço a realidade. Não sou apenas uma pessoa que estudou, se debruçou nos livros e atravessou barreiras. Além da formação teórica, pude advogar para empregados, empresas e ter o conhecimento em campo do que é a realidade de uma pessoa que tem uma meta e cuja meta é vencer barreiras.
Delaíde nasceu na roça goiana, como gosta de dizer. Ajudava o pai na lavoura, colocando a mão na terra para plantar milho e feijão. Aos 14, decidiu que não podia ficar mais ali e foi terminar o ensino fundamental na cidade. Trabalhou por um ano e meio como doméstica e dois anos como recepcionista no consultório de um médico, o mesmo médico que alguns anos depois a incentivaria a tentar a vida em Goiânia.
- Ele me achava inteligente, estudiosa e dizia que eu tinha de ir para Goiânia para fazer o curso normal, para ser professora. Eu adoro a profissão, respeito os professores, mas a minha profissão sempre foi ser advogada.
Aos 18 anos, já em Goiânia, voltou a trabalhar como doméstica. Com a ajuda do médico, que era casado com uma prima, conseguiu emprego na casa de outra família. Ganhava cama e comida em troca de serviços domésticos. Enquanto isso, estudava e lia tudo o que estivesse ao seu alcance.
Cinco anos depois passou no vestibular para direito em uma faculdade particular. Conseguiu uma bolsa no antigo crédito educativo. O governo pagava as mensalidades diretamente à universidade e Delaíde teria 48 meses de carência para começar a quitar.
Com o ensino superior vieram mudanças bruscas. Trocou o trabalho doméstico por um estágio em um escritório de advocacia. Apaixonou-se pelo direito trabalhista, ao qual chama de segundo casamento.
O primeiro veio dois anos após entrar na faculdade, quando conheceu o atual marido, Aldo Arantes. Ex-deputado federal, Arantes foi presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) poucos anos antes da ditadura militar (1964-1985). Do casamento, vieram duas filhas e um neto, de 11 anos.
Direito
A paixão de Delaíde pelo direito começou ainda em Pontalina. Antes mesmo de lidar com os escovões e vassouras nas casas onde trabalhou, a então menina gostava de assistir aos julgamentos no tribunal da cidade.
- No interior não tem muita opção. Não tinha peça de teatro, não tinha cinema, e uma coisa no interior que é muito forte, ainda hoje, são as sessões do júri. A cidade inteira assiste. Tenho a impressão que eu fui influenciada a fazer direito por assistir a esses júris, pelo aspecto teatral daquilo tudo.
À reportagem do R7, a ministra confidenciou uma passagem de sua vida que nunca revelou publicamente. Em uma das sessões do júri, deparou-se com um tio seu que estava sendo julgado por homicídio.
- Eu tinha mais ou menos uns seis anos. Foi um crime banal. Uma pessoa assassinou uma tia minha, irmã do meu pai, e esse meu tio vingou a morte da minha tia. Era muito comum antigamente, chamam de crime de vendeta [vingança]. Esse tio foi a júri por três vezes e absolvido nas três vezes por 7 a 0. Eu assistia a esses júris e achava tudo um espetáculo.
Trabalho
Após cursar a faculdade, Delaíde mergulhou na profissão. Estagiou e em pouco tempo abriu o seu próprio escritório de advocacia, especializado em relações trabalhistas, e que hoje é tocado pelas filhas. Por 30 anos lidou com todos os tipos de clientes, de empregadas domésticas, como ela fora, até grandes empresas.
A base que adquiriu foi suficiente para ser indicada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para ocupar uma vaga no TST. E foi a própria presidente Dilma Rousseff quem decidiu escolher o nome de Delaíde.
No mesmo gabinete espaçoso, as estantes ainda não estão todas ocupadas. De acordo com a ministra, parte da biblioteca está em casa e outra parte ainda em Goiânia. A parte que cabe ao escritório ainda não havia chegado até o dia da entrevista. As gavetas, no entanto, estão entupidas. Delaíde conta que tomou posse no dia 24 de março com 11 mil processos à sua espera.
- Em Goiás, as varas do trabalho, que são mais de 30, têm em média 2.000 cada uma. Mas não posso reclamar. Considero que não posso fazer um esforço concentrado no sentido de diminuir apenas volume. Preciso aliar o julgamento dos processos à qualidade do trabalho. São 11 mil vidas atrás dos processos. São 11 mil pessoas e 11 mil empregos que dependem de uma decisão minha.
Para dar conta do trabalho, a ministra chega ao tribunal entre 8h e 8h30 e não sai antes das 20h, podendo estender a jornada até as 22h. São de 12 a 14 horas de trabalho diárias, mas nada que se compare àquela rotina de doméstica nos idos de 1950, quando labutava em Pontalina.
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