A realização de trabalho fora da empresa, por si só, não afasta o direito do empregado ao recebimento de horas extras. Isso porque o artigo 62, I, da CLT, ao excluir alguns profissionais do regime de duração do trabalho previsto na CLT, impôs expressamente a necessidade da conjugação de dois fatores para essa exclusão: que a atividade seja exercida externamente e que seja impossível a fiscalização da jornada pelo empregador.
Portanto, não basta a inexistência de controle. Este deve ser mesmo impossível, porque, caso contrário, haveria o risco desse dispositivo da CLT ser desvirtuado e passar a ser utilizado pelo empregador com o único objetivo de não pagar horas extras.
Por essa razão, o juiz do trabalho substituto, Camilo de Lelis Silva, ao julgar um processo envolvendo essa matéria, na Vara do Trabalho de Pedro Leopoldo, chamou a atenção para a importância de a exceção do artigo 62 ser interpretada em harmonia com as evoluções tecnológicas, pois a CLT foi publicada em 01.05.1943, há mais de meio século, quando nem se falava em rastreamento via satélite. É certo que esse sistema é adotado pelas empresas de transporte, a princípio, para evitar furto de carga, mas ele pode e deve ser utilizado para verificar e controlar a jornada dos motoristas, e, principalmente, preservar a segurança não só do empregado, mas de todos os cidadãos que circulam pelas rodovias brasileiras.
O empregado alegou que, atuando como motorista de carreta, trabalhava de 5h às 22h, de segunda à sexta, aos sábados, de 6h às 15h, com intervalo de 30 minutos, e, em dois domingos por mês, de 8h às 18h. A reclamada limitou-se a afirmar que, como o trabalhador realizava atividade externa, não era sujeito a controle de horário, não tendo direito, portanto, a receber horas extras.
O magistrado esclareceu que o artigo 62, I, da CLT, não estabelece uma faculdade ao empregador, isentando-o do controle de horário e, muito menos, do pagamento de horas extras. A norma visa regulamentar as situações em que, de fato, há impossibilidade física de se controlar a jornada.
No caso do processo, ficou claro que existia controle do horário de trabalho. O preposto declarou que precisava fazer uma previsão do horário de chegada da carga ao destino, pois os motoristas carregavam cimento e tinham que entregá-lo antes do início do processo de fabricação do concreto. E a empresa poderia ser responsabilizada pelos clientes, caso houvesse prejuízo em razão de atraso na entrega. O preposto admitiu que já utilizou o sistema de rastreamento para verificar a hora de chegada do caminhão. Uma das testemunhas ouvidas, também motorista de carreta, afirmou que havia horário para chegar ao destino e que a empresa sempre telefonava para saber onde ele estava.
Portanto, o magistrado concluiu que havia controle de horários. Para ele, não há dúvida de que os tacógrafos e sistemas de rastreamento possibilitam o controle de jornada, pois eles permitem saber toda a rotina do veículo. O juiz acrescenta que não é aceitável que as empresas, podendo, deixem de controlar a jornada dos motoristas, para não pagarem horas extras. O juiz deve interpretar a lei de acordo com a sua finalidade social. E, nesse caso, o objetivo maior é preservar a vida, pois é notório que os motoristas que trafegam dia e noite, sem dormir, expõem a risco a própria vida e a de quem com eles cruza pelo caminho.
Com base nas provas, o juiz fixou o horário de trabalho do reclamante, de 7h às 22h, de segunda à sexta-feira, com duas horas de intervalo, e de 7h às 15h aos sábados. Por fim, condenou a empresa a pagar como extras as horas que ultrapassem a 8ª diária e a 44ª semanal, com acréscimo de 50% e reflexos nas demais parcelas de direito. A reclamada apresentou recurso, mas o Tribunal de Minas manteve a sentença.
Assessoria de Comunicação Social
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